COMPARTILHAR

COP 28: o consenso tímido sobre transição energética

13/12/23 - Camila Dias de Sá

COP 28: o consenso tímido sobre transição energética

https://www.cop28.com/en/food-and-agriculture

Considerações sobre temas de interesse do agronegócio e seus desafios

A 28ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, COP28, em Dubai terminou com expectativas contraditórias. Do lado positivo houve o anúncio da aprovação do Fundo de Perdas e Danos, mecanismo de apoio aos países que já estão sofrendo rotineiramente com os efeitos do aquecimento global. O lado da desesperança nasceu com a polêmica declaração do presidente da COP e chefe da empresa petrolífera estatal dos Emirados Árabes Unidos, Al Jaber, de que “não há ciência” por trás da demanda por redução de combustíveis fósseis.

O desfecho principal, que está sendo chamado de “Consenso dos Emirados Árabes”, foi o surpreendente texto que conseguiu conciliar avanços para a transição dos combustíveis fósseis. O Global StockTake (GTS) — que é o Balanço Global de progresso em relação ao Acordo de Paris, do impacto agregado de todas as políticas e metas nacionais de clima — mostra que os países não estão alcançando as reduções de emissões na velocidade necessária para manter o aumento da temperatura terrestre em 1,5°C. Em 2025, antecedendo a COP30, novos planos (NDCs) precisarão ser apresentados. Nesse sentido, o framework de ação (objetivos e como fazer) precisa ser acordado em um texto final de decisão. A versão final, segundo analistas, representa “o primeiro passo para o fim dos combustíveis fósseis”. Ainda que o documento carregue algumas lacunas e ambiguidades, o saldo final é considerado equilibrado.

O grupo de trabalho conjunto Sharm el-Sheikh em implementação de ação climática na agricultura e na segurança alimentar (antigo Koronivia) avançou em discussões relativas ao reconhecimento do papel da agropecuária no combate ao aquecimento global. O grupo definiu um plano de trabalho até a COP31, em 2026, para promover a implementação de iniciativas e políticas públicas e o devido financiamento para a adaptação da agricultura às mudanças climáticas e garantia da segurança alimentar. Tal plano inclui as bases para a elaboração de um reporte anual sobre avanços e lacunas, assim como um calendário anual de interações para a divulgação de experiências na implementação, além de um portal online para registro, acompanhamento e compartilhamento das políticas e experiências dos países. Nota-se que esse documento ainda não foi acordado pelas partes por completo, mas trata-se de uma primeira versão para ser aprimorada nas reuniões intermediárias entre COPs que acontecem todos os anos em junho em Bonn.

Outra frente de diálogo enfatizada na COP28 diz respeito a “Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática”, ou simplesmente “Food Systems”, que é o jargão mais utilizado, inclusive no Brasil. Ele se refere a um conjunto de argumentos cada vez mais vocalizado que defende uma reforma nos sistemas alimentares, ou seja, na maneira de produzir comida, para limitar o aquecimento da temperatura global em 1,5°C.

Nesse contexto, a Declaração da COP28 dos EAU sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática foi anunciada com o apoio de 134 países, incluindo o Brasil. O texto traz como visão compartilhada a ideia de que “o caminho para alcançar plenamente os objetivos de longo prazo do Acordo de Paris deve incluir a agricultura e os sistemas alimentares e que por sua vez devem urgentemente adaptar-se e transformar-se para responder aos imperativos das alterações climáticas”. O texto destaca algumas ações prioritárias que devem ser consideradas nas NDCs dos países até a COP30 (2025), como, por exemplo, iniciativas de adaptação e resiliência com apoio financeiro e técnico. Espera-se o andamento do tema por meio do envolvimento do setor privado e da cooperação entre os países.

O Objetivo Global de Adaptação (GGA), documento que decidirá o financiamento e a mensuração do progresso na adaptação, pouco avançou. Tem poucos objetivos, plano de trabalho pífio, assim como o comprometimento com financiamento.  Ressalta-se que estruturas locais de adaptação contribuem para proteção das cadeias de globais de suprimentos, lição que deveria ter sido aprendida com a pandemia da covid-19.

Finalmente, em tempos de discussão sobre o estabelecimento do mercado regulado de carbono no Brasil e sua potencial integração como o mercado voluntário, vale mencionar algumas considerações nesse tema. Para além das negociações oficiais das delegações na COP28, a conferência ficou marcada por um movimento de reação do setor que opera o mercado voluntário. Em contraposição a uma série de denúncias de fraudes, excessos e violações de direitos em projetos de créditos de carbono, os principais padrões de certificação anunciaram durante a conferência uma iniciativa de colaboração para aprimorar a transparência e a criação de indicadores padronizados para medir benefícios adicionais. Também anunciaram adequação às exigências do Integrity Council for Voluntary Carbon Markets (Conselho de Integridade para Mercados Voluntários de Carbono), iniciativa de governança independente que visa aperfeiçoar a integridade ambiental dos projetos.

É um marco importante o reconhecimento, na COP28, de que a crise climática é essencialmente uma crise dos combustíveis fósseis. Embora seja algo que já devesse ter ocorrido antes, essa construção a passos lentos é muito característica das decisões de cunho multilateral. Característica que também implica desafios gigantescos à frente. Nesse contexto, o papel do Brasil segue sendo o de provedor de soluções baseadas na natureza que promovam mitigação e potenciais cobenefícios locais.

 

Já segue nossos canais oficiais? Clique e acompanhe nosso Canal de WhatsApp, nos siga no LinkedIn e se inscreva para receber quinzenalmente nossa Newsletter. Se mantenha atualizado com pesquisas e conhecimento sobre as questões globais do agronegócio.