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Preços de alimentos voltam a pressionar a inflação no Brasil

17/10/24 - Beatriz Emi Ueda | Victor Martins Cardoso

Macroeconomia | Segurança Alimentar

Preços de alimentos voltam a pressionar a inflação no Brasil

canva.com

Com alta de 0,5% em setembro, a inflação de alimentos e bebidas reflete eventos climáticos que prejudicaram a produção, elevando a preocupação com o controle da meta inflacionária

O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) registrou alta de 0,44% em setembro em relação a agosto, acumulando uma alta de 3,71% em 2024. O resultado frustrou algumas expectativas, especialmente após a deflação de 0,02% observada em agosto, minando a possibilidade de o Banco Central seguir com a redução da taxa básica de juros (Selic). Com isso, o IPCA acumulado em 12 meses retomou sua tendência de alta, alcançando 4,42%, aproximando-se do teto da meta de inflação para o ano, que é de 4,5%.

 

O resultado observado em setembro foi influenciado principalmente por dois dos nove grupos que compõem o cálculo do IPCA: “habitação”, que registrou a maior alta, de 1,8%, impactada sobretudo pela conta de luz, que subiu 5,36% em comparação a agosto; e  “alimentos e bebidas”, que apresentaram um acréscimo de 0,5%. Em ambos os casos, notam-se os efeitos da seca registrada neste ano, que pressionou os preços desses itens.

Focando especificamente nos alimentos, as estiagens prolongadas e as queimadas deste ano reduziram a produção e a produtividade das lavouras, além de afetar a qualidade dos produtos oferecidos ao consumidor final. Enquanto a oferta é limitada por esses fatores, o Brasil tem registrado um aumento no consumo das famílias — alta de 1,3% no segundo trimestre de 2024 ante o primeiro trimestre de 2024, e um crescimento de 4,9% em comparação ao mesmo período de 2023, segundo dados do IBGE.  Essa combinação de restrição na oferta e aumento da demanda resulta em uma inflação mais elevada dos alimentos.

 No âmbito da alimentação domiciliar, destacam-se os aumentos registrados nos preços do café (moído), feijão (preto), carnes, frutas e óleos e gorduras, com alta em setembro em relação a agosto de 4,02%, 3,52%, 2,97%, 2,79% e 2,21%, respectivamente.

No caso do café, a elevação nos preços pode ser explicada pela forte restrição hídrica. O longo período sem chuvas prejudicou a atual safra, tanto do café arábica quanto do conillon, o que, somado à baixa disponibilidade global do produto, pressionou ainda mais os preços.

No caso das carnes, após quedas de preço ao longo de 2023 e do primeiro semestre de 2024,  observa-se uma tendência positiva nos últimos meses, com um aumento acumulado de 3,51% apenas entre agosto e setembro. No primeiro semestre deste ano, o aumento no número de abates elevou a oferta, levando à redução dos preços da proteína. Entretanto, com o aumento de municípios em condições de seca extrema, de 201 em agosto para 216 em setembro, o ganho de peso dos animais vem sendo prejudicado, atrasando os abates e pressionando os preços. Adicionalmente, o crescimento das exportações de carne in natura entre janeiro e setembro deste ano tiveram uma alta de 30% em relação ao mesmo período do ano anterior, o que diminuiu a sua oferta interna, contribuindo para o aumento dos preços. As expectativas de mercado indicam que a inflação da carne bovina poderá acumular cerca de 8% até o final do ano.

A seca também teve impacto significativo sobre os preços das frutas, com destaque para os cítricos. O limão registrou um aumento expressivo de 30,4%, enquanto a laranja-pera teve uma alta de 10%. A escassez de chuvas reduziu a oferta de limão no campo e comprometeu a qualidade do produto, levando ao cancelamento de algumas exportações. No caso das laranjas, além da seca e das temperaturas elevadas, os preços foram pressionados pela incidência do “greening”, uma doença que afeta tanto a qualidade quanto a produtividade das frutas. A laranja-pera, em particular, atingiu preços históricos devido à combinação de oferta limitada e alta demanda.

Outro grupo que registrou forte alta foi o de óleos e gorduras, com destaque para o óleo de soja. Segundo o Cepea/Esalq, as exportações de óleo de soja têm se mantido aquecidas, sendo o único produto do complexo de soja brasileiro que aumentou as suas vendas externas em relação ao ano passado. A forte demanda externa, somada a um possível efeito substituição causado pelo aumento dos preços do azeite desde o início do ano, impulsionou a demanda interna por óleo de soja, superando a oferta disponível. Como resultado, a inflação do produto registrou um aumento de 3,53% em setembro.

Diante desse cenário geral de aumento nos preços, a expectativa de inflação para o final do ano no Brasil subiu para 4,4%, conforme o Boletim Focus divulgado nesta segunda-feira, 14 de outubro, valor próximo ao teto da meta, de 4,5%. No entanto, há um consenso no mercado de que será muito difícil conter o índice abaixo desse teto, o que pode forçar o BC a seguir com o aumento da taxa básica de juros, resultando em uma desaceleração da atividade econômica do país. No entanto, para a próxima safra, espera-se melhores resultados pelo lado do agro. De acordo com as primeiras estimativas da Conab para a safra de grãos para 2024/25, projeta-se uma produção recorde, com um aumento de 8,3% em relação à safra 2023/24. Para produtos importantes na cesta básica do brasileiro, como arroz e feijão, a Conab estima um crescimento de 13,8% e 0,5% na produção, respectivamente. Se esse cenário se concretizar, poderá haver um alívio nos preços dos alimentos devido ao aumento da oferta.

 

Referências e Leituras recomendadas:

CARREGOSA, Lais. ANEEL aciona bandeira tarifária vermelha 2 para outubro; conta de luz fica mais cara. G1 - Globo, 4 out. 2024. Economia. Disponível em: Aneel aciona bandeira tarifária vermelha 2 para outubro; conta de luz fica mais cara | Economia | G1 (globo.com). Acesso em: 15 out. 2024.

AMORIM, Daniela; MENDES, Daniel Tozzi. Inflação acelera e fica em 0,44%, puxada por conta de luz e alimentos; em 12 meses, IPCA vai a 4,42%. Estadão, 15 out. 2024. Economia. Disponível em: Inflação acelera e fica em 0,44%, puxada por conta de luz e alimentos; em 12 meses, IPCA vai a 4,42% - Estadão (estadao.com.br). Acesso em: 15 out. 2024.

DINIZ, Ana Carolina. Inflação da carne pode chegar ao dobro do índice geral em 2024. G1 - Globo, 12 out. 2024. Agronegócios. Disponível em: Inflação da carne pode chegar ao dobro do índice geral em 2024 (globo.com). Acesso em: 15 out. 2024.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Produção agrícola municipal: culturas temporárias e permanentes. Acesso em: 16 out. 2024.

Outubro terá bandeira tarifária vermelha patamar 2. Agência Nacional de Energia Elétrica, 1 out. 2024. Notícias. Disponível em: Outubro terá bandeira tarifária vermelha patamar 2 — Agência Nacional de Energia Elétrica (www.gov.br). Acesso em: 15 out. 2024.

Preço do limão dispara 30%; veja outros alimentos que ficaram mais caros em setembro com a seca. G1 - Globo, 30 set. 2024. Agronegócios. Disponível em: Preço do limão dispara 30%; veja outros alimentos que ficaram mais caros em setembro com a seca | Agronegócios | G1 (globo.com). Acesso em: 15 out. 2024.

QUINTINO, Larissa. Mercado volta a revisar a projeção de inflação, que flerta com o teto da meta. Veja, 14 out. 2024. Economia. Acesso em: 15 out. 2024.

 

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