Quem vai ficar no campo? O problema da mão de obra nas propriedades rurais
25/04/25 - Pedro Alberto Pianetti Puhler

Wenderson Araújo/Trilux - Sistema CNA/Senar
A escassez da força de trabalho no campo se tornou um dos maiores desafios para o setor, comprometendo a sustentabilidade futura dos negócios
A escassez de mão de obra no campo se tornou um dos maiores desafios para médias e pequenas propriedades rurais. O que antes era visto como uma dor de safra, hoje compromete a sustentabilidade do negócio. Entre a mecanização, os custos crescentes e a pressão por produtividade, uma pergunta persiste: quem vai tocar o agro de amanhã, se falta gente hoje?
Essa escassez vai além do número de braços disponíveis. Trata-se também de atratividade, valorização e bem-estar do trabalhador rural. Um tema que merece ser tratado com a mesma seriedade que se dá à tecnologia e ao crédito.
Segundo dados do último Censo (IBGE, 2022) , menos de 15% da população brasileira vive hoje no campo — e a maior parte é composta por pessoas acima de 50 anos. A juventude está migrando para os centros urbanos, em busca de oportunidades, educação e qualidade de vida.
Nas pequenas e médias propriedades, isso se traduz em sobrecarga. Muitos produtores acumulam funções, trabalham sem descanso, e ainda assim não conseguem encontrar pessoas dispostas a entrar — ou permanecer — na lida rural.
O campo se modernizou: tratores com GPS, sensores no solo, softwares de gestão. Mas a formação técnica da mão de obra ainda é insuficiente. Boa parte dos trabalhadores não está preparada para lidar com as novas demandas do agro — e isso gera frustração tanto para a empresa quanto para trabalhador.
Além disso, os jovens que ainda consideram ficar no campo buscam mais que salário: querem estabilidade, reconhecimento e melhores condições de trabalho. Muitos produtores, por sua vez, ainda operam com modelos antigos, em que o esforço físico e a jornada longa são vistos como norma.
Esse desalinhamento torna o agro menos competitivo como ambiente de trabalho — e afasta talentos que poderiam fazer a diferença.
Mesmo quando conseguem contratar, produtores enfrentam alta rotatividade. A mão de obra qualificada é disputada, e as grandes propriedades são as que conseguem oferecer mais benefícios. Para as médias e pequenas, o custo de oferecer benefícios que atraiam e mantenham bons trabalhadores muitas vezes inviabiliza o negócio.
Cada troca de funcionário significa tempo, retreinamento e perda de ritmo na operação. E com menos gente, aumenta a sobrecarga e o risco de falhas.
Estudos recentes mostram que o bem-estar do trabalhador rural está ligado a mais do que o valor pago no fim do mês. Uma pesquisa feita no oeste do Paraná, apontou que o bem-estar psicológico, acesso à saúde, educação e qualidade de vida são os principais fatores que mantêm o agricultor no campo (BERGHAUSER, 2023).
Nepomuceno (2017) indicou que, mesmo em contextos de baixa renda, trabalhadores com forte senso de pertencimento e boas relações comunitárias apresentaram altos níveis de satisfação.
E quando há ações práticas, os resultados são visíveis. Em Juína (MT) , por exemplo, produtores de leite que participaram de programas de ginástica laboral relataram melhora física, menos dores e mais disposição — ou seja, mais produtividade aliada ao bem-estar (CAVALHEIRO, 2014).
Esses exemplos mostram que a possibilidade de uma maior satisfação do empegado no campo é possível — mas precisa ser cultivada com intencionalidade.
A profissionalização da gestão de pessoas é uma possibilidade para o caminho sustentável no campo. E ela começa com passos simples, como:
- Planejar a demanda de mão de obra com antecedência;
- Oferecer treinamentos práticos e acessíveis;
- Criar um ambiente de trabalho respeitoso, com diálogo aberto;
- Garantir pausas, moradia adequada e acesso a lazer básico;
- Estimular senso de pertencimento, com reconhecimento e participação nas decisões;
- Fazer parcerias com escolas técnicas, sindicatos e cooperativas.
Profissionalizar a gestão de pessoas não é burocratizar. É investir nas pessoas como parte central do negócio. Porque gente motivada produz mais, melhora a retenção para a empresa e ajuda a construir um agro mais resiliente.
O agro brasileiro é uma potência, mas não pode ignorar uma de suas maiores vulnerabilidades: a falta de gente. A tecnologia ajuda, os mercados incentivam, mas nada disso adianta se não houver quem plante, colha e cuide.
Valorizar a mão de obra é valorizar o próprio futuro da produção rural. E isso passa por escuta, respeito e estratégias concretas para tornar o campo um lugar melhor para viver e trabalhar.
Produzir exige suor, técnica e estratégia — mas nada acontece sem gente. Valorizar o trabalhador rural é garantir que o agro continue crescendo!
*Pedro Alberto Pianetti Puhler, Administrador pelo INSPER, Sócio – Puro Café Ind. e Founder – MOMBAK Coldbrewcoffee. Membro do Comitê Alumni de Agronegócios do Insper – email: pedro@mombakcoffee.com.br
*O texto acima é de responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, uma opinião do Insper Agro Global.
Fontes
BRASIL, I. B. G. E. Censo Demográfico 2022. Dados nacionais. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Brasil, 2010.
CAVALHEIRO, Claudionor Nunes. A influência da prática da ginástica laboral na qualidade de vida de trabalhadores de propriedades produtoras de leite: estudo de caso na comunidade São Justino em Juína/MT. 2015.
APANEPOMUCENO, B. B. et al. Bem Estar Pessoal e Sentimento de Comunidade: um estudo psicossocial da pobreza. Revista Psicologia em Pesquisa, v. 11, n. 1, 2017.
Já segue nossos canais oficiais? Clique e acompanhe nosso Canal de WhatsApp, nos siga no LinkedIn e se inscreva para receber quinzenalmente nossa Newsletter. Se mantenha atualizado com pesquisas e conhecimento sobre as questões globais do agronegócio.
Leia Também

Artigos em jornais e revistas | Insper Agro Global | 24/04/25
A COP30 e o Agro Brasileiro: entre o desafio climático e a oportunidade de liderança
Como a transição sustentável da agropecuária pode viabilizar o cumprimento da NDC e reposicionar o Brasil na agenda climática internacional

Artigos em jornais e revistas | Insper Agro Global | 31/03/25
O Brasil precisa transformar a logística do agronegócio de gargalo em diferencial competitivo
Investimentos em logística não têm acompanhado o crescimento da produção e uma mudança nessa rota é imediatamente necessária para manter a competitividade no setor

Artigos em jornais e revistas | Insper Agro Global | 26/02/25
O novo marco de carbono em 10 pontos essenciais
Em 10 pontos essenciais o texto se propõe a explicar a chegada do novo modelo de “cap and trade” e como o Brasil adotou um sistema tripartido de mercado de carbono

Artigos em jornais e revistas | Insper Agro Global | 30/01/25
Governo Trump 2.0: novos desafios no cenário geopolítico global e impactos no agronegócio
O que esperar do segundo mandato de Donald Trump e as suas implicações para o agro brasileiro