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BIOENERGIA E BIOECONOMIA

O que são alimentos orgânicos e quais são as diferenças entre as certificações no Brasil?

10/04/23 - Aldara da Silva César

Segurança Alimentar | Baixo Carbono | Desenvolvimento Social | Meio Ambiente | Uso da Terra

O que são alimentos orgânicos e quais são as diferenças entre as certificações no Brasil?

Wenderson Araújo/Trilux - Sistema CNA/Senar

A agricultura orgânica como nicho alternativo para a inserção da agricultura familiar visando um mercado em ascensão que busca alimentos saudáveis e preza pela sustentabilidade.

A produção orgânica é um sistema de integração de práticas culturais, biológicas e mecânicas que promovem a ciclagem de recursos, o equilíbrio ecológico e conservam a biodiversidade. Assim, trata-se de um sistema que prioriza técnicas ecológicas em busca de menores impactos ambientais, sociais e na saúde ao eliminar o uso de fertilizantes e pesticidas sintéticos, antibióticos e hormônios, sementes e raças geneticamente modificadas, conservantes, aditivos e irradiação. 

As fazendas orgânicas, em geral, cultivam uma maior variedade de produtos agropecuários em uma única área, buscando-se otimizar a competição por nutrientes e espaço entre as espécies. Isso, por sua vez, resulta em menos chance de baixa produção ou quebra de rendimento em todos eles simultaneamente. 

Este tipo de sistema permite que a produção também seja feita em áreas isoladas e de difícil acesso. Pequenos produtores se beneficiam do processo, pois aumentam sua produção gerenciando recursos locais, sem depender de insumos externos ou sistemas de distribuição de alimentos. Dessa forma, os retornos do mercado da agricultura orgânica vêm a contribuir para a segurança alimentar local, aumentando também a renda familiar e fixação do produtor ao meio rural.

O desempenho da agricultura orgânica na produção dependerá do sistema de manejo agrícola anterior. Por exemplo, em terras irrigadas, a conversão do sistema de cultivo tradicional para a agricultura orgânica geralmente leva a rendimentos quase idênticos, enquanto, na tradicional agricultura de sequeiro (com poucos insumos externos), a agricultura orgânica tem o potencial de aumentar os rendimentos.

A falta de estatísticas oficiais e a confidencialidade das organizações que lidam com produtos orgânicos fazem com que seja difícil a coleta de dados desse setor. A agricultura orgânica representa 2% das vendas globais de alimentos, mas as mudanças de hábitos dos consumidores e a busca por a alimentação saudável e aspectos relacionados à sustentabilidade contribuem para esse mercado tenha constante expansão no mundo todo.

Figura 1: Mundo - Crescimento da terra agrícola orgânica e participação orgânica 2000-2021

Globalmente, o crescimento em área de produção orgânica entre 2000-2020 foi na ordem 400%. No entanto, isso ainda representa apenas 1,6% das terras agrícolas. Verifica-se que a distribuição de terras destinadas à produção orgânica não é uniforme entre os continentes. A principal região produtora, Oceania, tem um menor número de produtores e esses detêm áreas maiores. Já a Ásia e África, locais que concentram quase 80% dos produtores orgânicos, as áreas são menores. 

Tabela 1. Área destinada à produção de orgânicos e número de produtores de orgânicos no mundo em 2021.

Fonte: FiBL, 2023

As vendas no varejo indicam que os principais mercados consumidores são América do Norte (43,2%), a União Europeia (43,7%) e a Ásia (11%), sinalizando o comércio com a Oceania, principalmente em direção aos Estados Unidos e Canadá.    Estima-se que o mercado global de orgânicos deva atingir US$ 497,3 bilhões até 2030.


Tabela 2. Dados globais: Vendas ao varejo e consumo per capita por região, em 2021.

Fonte: FiBL (2023)

Nota: Alguns países da América Latina estão com dados desatualizados.


O Brasil possui 1,5 M hectares destinados à produção orgânica. Foi o 4º país atrás da China, França e Espanha, que mais cresceu sua extensão de terras orgânicas em 2021, representando 12,3% (162 mil hectares). Entre 2010 e 2020 este crescimento foi de 110,2%. Dados divulgados pelo MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) em seu Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, que registra produtores orgânicos certificados – pessoas físicas ou jurídicas – constam, em abril de 2021, 25.510 produtores, distribuídos em todas as regiões brasileiras. Estima-se que cerca de 75% dos produtores sejam agricultores familiares. Dos quase 70 mil estabelecimentos agropecuários certificados para a produção orgânica, cerca de 40 mil se dedicam à produção vegetal; 18 mil à produção animal e 11 mil têm produção vegetal e animal orgânicas. 

Os produtos brasileiros orgânicos se concentram na produção in natura e em poucos produtos processados. A escassez de matéria-prima que atenda a essa cadeia, bem como a falta de regularidade de entrega da mesma para o setor indicam importantes problemas de coordenação entre os elos dessa cadeia produtiva. A elevada dependência e incerteza da indústria em relação ao segmento fornecedor de matéria-prima é fator limitante do desenvolvimento do processamento no país. 

As certificações são um importante elemento no mercado de orgânicos, pois a qualidade não é observável, ou seja, nem após o consumo é possível identificar a veracidade da informação. Dessa forma, a certificação é um mecanismo essencial no processo de transação e na conquista da confiança de diversos mercados. No Brasil, há duas formas de se obter a certificação: por meio de auditoria ou pelo sistema participativo de garantia. 


Figura 2: Selos utilizados nos produtos certificados como orgânicos via auditoria ou sistemas participativos 

Fonte: Souza, Batista e César (2019)


Na certificação por auditoria, a concessão do selo SisOrg é feita por uma certificadora pública ou privada credenciada no MAPA. O organismo de avaliação da conformidade obedece a normas reconhecidas internacionalmente, além dos critérios estabelecidos pela legislação brasileira. Dessa forma, essa certificação permite o produtor atuar em mercado nacional e internacional.

Já o sistema participativo de garantia (SPG) caracteriza-se pela responsabilidade coletiva dos membros do sistema (produtores, consumidores, técnicos e demais interessados). Na prática, para estar legal, um SPG tem que possuir um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (Opac) legalmente constituído, que responderá pela emissão do SisOrg. Essa certificação permite o produtor atuar em mercado nacional.

No entanto, o processo da certificação representa um gargalo produtivo no Brasil, pois há custos de conversão do sistema convencional para o sistema orgânico e de certificação. Contudo, a certificação pode ser tornar menos necessária quando há uma relação de proximidade entre produtor e consumidor, uma vez que essa conexão pode gerar a informação necessária para a tomada de decisão de compra. Nesse sentido, uma estratégia de comercialização local ou até mesmo regional podem reduzir tais custos. Neste caso, o mercado se fundamenta, portanto, na confiança, diminuindo assimetrias de informações.

Vale destacar que a legislação brasileira abriu uma exceção na obrigatoriedade de certificação dos produtos orgânicos para a agricultura familiar. Dessa forma, há um controle social na venda direta por meio de agricultores cadastrados no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos. Dessa forma, essa autorização permite fomentar a venda de produtos orgânicos em circuitos curtos de comercialização, como é o caso das feiras livres.

Muitas perguntas são feitas com relação à capacidade da agricultura orgânica de fornecer alimentos para resolver a questão da insegurança alimentar. Vale destacar que a fome no mundo decorre não de questões de quantidade de alimentos produzidos, mas sim, de acesso desses alimentos a algumas comunidades. Contudo, as experiências materiais e empíricas discutidas na FAO (Food and Agriculture Organization) demonstram que a agricultura orgânica tem potencial para alimentar o mundo, nas circunstâncias certas. No Brasil, ainda, destaca-se a agricultura orgânica como nicho alternativo para a inserção da agricultura familiar.

 

Referências e Leituras indicadas:

CÉSAR, A. S.; BATALHA, M. O.; PIMENTA, M. L. . A certificação organica como fator estratégico na governança das transações no mercado de alimentos. OrganizaçõesRurais e Agroindustriais (UFLA), v. 3, p. 1-10, 2008.

EMBRAPA, 2021. Pesquisa apresenta panorama global da produção de alimentos orgânicos em países de cinco continentes.

FAO. Organic Agriculture.

FiBL.

MAPA, 2020 O que são Produtos Orgânicos?

MAPA, 2023. Cadastro de Produtores Orgânicos.

PIRES, V. W. B.; A, BATISTA, A.P., SOUZA, R. P. de CÉSAR, A. S.  A coordenação na cadeia produtiva de orgânicos: análise das transações entre indústria, fornecedores e compradores no Brasil. Agroalimentaria. 2017. 23(45): 175-189.

SOUZA, R. P de, BATISTA, A. P., CÉSAR A. da S. As tendências da Certificação de Orgânicos no Brasil. As tendências da Certificação de Orgânicos no Brasil. Estudos Sociedade e Agricultura, v. 27, n. 1, p. 95-117, fev. 2019.

SEBRAE, 2022. Mercado de orgânicos: projeções e tendências.

SEBRAE, 2023. Produtos orgânicos, um mercado em expansão.

USDA. Organic Production.

CÉSAR, A. S.; BATALHA, M. O.; PIMENTA, M. L. (2008). A certificação organica como fator estratégico na governança das transações no mercado de alimentos.

PIRES, V. W. B.; A, BATISTA, A.P., SOUZA, R. P. de CÉSAR, A. S. (2017) A coordenação na cadeia produtiva de orgânicos: análise das transações entre indústria, fornecedores e compradores no Brasil.

SOUZA, R. P de, BATISTA, A. P., CÉSAR A. da S. (2019). As tendências da Certificação de Orgânicos no Brasil. As tendências da Certificação de Orgânicos no Brasil. 

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GLOSSÁRIO

Agricultura de sequeiro:

É uma técnica agrícola para cultivar terrenos onde a pluviosidade é diminuta. A expressão sequeiro deriva da palavra "seco" e faz contraponto com a palavra “brejeiro” que vem de “brejo”. Na agricultura de sequeiro, a plantação ocorre em solo firme, diferentemente da agricultura de brejeiro, comum em países asiáticos.

Assimetrias de informações:

É o nome que se dá para quando uma das partes possui mais informações acerca de um produto ou serviço do que a outra. 

Circuitos curtos de comercialização:

São sistemas agroalimentares alternativos em que se busca a proximidade do produtor com o consumidor fortalecendo a agricultura local e regional.

Organismo participativo de avaliação da conformidade (OPAC):

Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade - Os OPACs correspondem às certificadoras no Sistema de Certificação por Auditoria. São os OPACs que avaliam, verificam e atestam que produtos ou estabelecimentos produtores ou comerciais atendem as exigências do regulamento da produção orgânica.

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