ECONOMIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL
Qual é a dependência do agro brasileiro das importações de fertilizantes?
07/08/25 - Luiz Arthur Chiodi Pereira | Victor Martins Cardoso
Comercio Internacional | Macroeconomia | Tecnologia

canva.com
O papel central das importações de fertilizantes na agricultura brasileira e suas implicações econômicas e estratégicas.
Os insumos agrícolas são produtos ou serviços utilizados para garantir a nutrição, proteção e desenvolvimento de lavouras, podendo variar desde sementes e defensivos até maquinários e mão de obra. Dentro desse grupo de produtos e serviços, destacam-se os fertilizantes, substâncias que fornecem os nutrientes necessários para o desenvolvimento das lavouras. Esse tipo de insumo é fundamental no fornecimento de nutrientes essenciais para a produção agrícola, como os macronutrientes (nitrogênio, fósforo e potássio) e os micronutrientes (boro, cloro, zinco, entre outros).
No Brasil, onde grande parte da área geográfica é coberta pelo cerrado – mais de 200 milhões de hectares –, esse insumo tem uma importância ainda maior. O bioma apresenta diversas restrições naturais à produção agrícola, já que possui solos ácidos com baixa fertilidade, o que torna o uso de fertilizantes uma prática imprescindível para a produção de alimentos. Entretanto, o Brasil ainda precisa buscar a maior parte desse insumo fora das suas fronteiras, tornando a produção mais exposta a choques externos.
De acordo com o Governo Federal, os fertilizantes mais aplicados no país são os macronutrientes primários: fertilizantes nitrogenados (N), fosfatados (P) e potássicos (K) que podem ser aplicados separadamente ou em complexo NPK. De acordo com a FAO, em 2023, o Brasil produziu cerca de 500 mil toneladas de nitrogênio, 1,95 milhões de toneladas de fósforo e 215 mil toneladas de potássio.
A FAO ainda aponta uma alta relação de dependência de importações que é confirmada quando se analisa a relação importação/consumo que foi de mais de 90% para o complexo NPK em 2023. A alta dependência de importações se reflete na ineficiência produtiva do Brasil, as métricas de produção/consumo são próximas de 8% para nitrogênio, 44% para fósforo e 3% para potássio. Em 2024, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX), o Brasil importou um total de 44 milhões de toneladas do complexo NPK, sendo que cerca de 37% eram de nitrogênio, 11% de fósforo, 32% de potássio e 20% de demais variedades nitrogenadas, fosfatadas ou potássicas;
O alto valor importado de fertilizantes pelo Brasil se traduz em um descompasso na balança comercial. De acordo com a SECEX, em 2024, o valor total exportado do complexo foi de cerca de US$ 278 milhões, enquanto o valor total importado foi de cerca de US$ 13,5 bilhões, um déficit de aproximadamente US$ 13,2 bilhões.
Essa necessidade de importar um alto volume de fertilizantes acarreta em custos e a um maior risco para os produtores brasileiros: são produtos com custos atrelados ao dólar e os gastos com fertilizantes possuem uma alta sensibilidade ao câmbio e choques externos. De acordo com a Conab, em 2024, os fertilizantes representaram, em média, 23% dos custos totais nas culturas de soja, milho e algodão. Já no custo total da produção de café, em 2023, essa proporção foi de 24%.
Em 2022, por exemplo, o início do conflito entre Rússia e Ucrânia implicou em uma disparada do dólar e dos preços de fertilizantes, tendo em vista que a Rússia e o leste europeu são importantes fornecedores globais desses insumos. Segundo o Banco Mundial, o preço internacional da ureia – principal fonte de fertilizantes nitrogenados – subiu mais de 100% entre o final de 2021 e meados de 2022. Esse fato se agravou ainda mais dado que uma parte relevante do NPK consumido do Brasil é proveniente de da Rússia.
Com grande dependência do mercado externo, a produção de fertilizantes no Brasil vem ganhando importância estratégica. Na esfera pública, o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF) foi promulgado em 2022 com o objetivo de diminuir a dependência nacional de importações de tais insumos ao buscar o aumento da produção nacional. Medidas como atração de investimentos diretos em minas e fábricas, incentivo à P&D e melhoria de infraestrutura e logística são algumas das diretrizes do PNF. O objetivo é chegar até 2050 com cerca de 50% da demanda brasileira por fertilizantes atendida pela produção interna, principalmente do complexo NPK, mas também existem diretrizes para aumento da produção e utilização de compostos orgânicos e organominerais. Como resultado do PNF nos últimos 3 anos foram observados aumento dos investimentos no setor como a retomada da construção de fábricas por parte da Petrobrás em Araucária (PR) e Três Lagoas (MS).
Já na esfera privada, alguns projetos podem ser destacados. Desses diversos projetos, cinco são de capital privado e possuem capacidade de diminuir a dependência externa de fertilizantes: Santa Quitéria (CE), Tiros e Uberaba (MG), Lavras do Sul (RS) e Autazes (AM). Este último envolve a estruturação do Projeto Autazes da Potássio do Brasil que envolve a construção do maior complexo de exploração de potássio do Brasil com minas, fábricas e portos. Esse projeto tem perspectiva de já no início da operação produzir cerca de 2,5 milhões de toneladas de potássio que serão destinadas 100% ao mercado interno.
Essa virada de chave na busca por eficiência produtiva de fertilizantes no país além de buscar suprir parte da demanda interna leva a uma maior previsibilidade para o produtor. Nos últimos anos foi possível observar a escalada de conflitos militares e sanções econômicas em importantes zonas produtoras de fertilizantes, como Rússia, Ucrânia e Oriente Médio, além da Guerra Comercial EUA x China que também afeta as cadeias produtivas e preços. Esse fenômeno implica em incertezas sobre abastecimento e preços para o produtor brasileiro devido a possíveis rearranjos das cadeias produtivas.
A realidade da demanda brasileira por fertilizantes é complexa. Envolve grande dependência externa, expondo produtos a choques externos – o que se torna ainda mais desafiador em um momento que a tensão global entre países se eleva -, e desafios internos, como capacidade de produção e até mesmo a logística, que afeta o escoamento e os preços de tais insumos. Portanto, é importante que exista um movimento estratégico efetivo envolvendo entidades públicas e privadas que busca sanar esse problema ou ao menos diminuir a dependência externa de fertilizantes. A proposta do PNF é um dos caminhos e indica uma melhoria das perspectivas em relação à oferta. Isso pode implicar em melhores custos para o produtor que ainda pode se converter em um incremento de produção e produtividade do agronegócio brasileiro.
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GLOSSÁRIO
Complexo NPK ou fertilizante NPK refere-se à categoria de fertilizantes que contenham proporções de Nitrogénio (N), Fósforo (P) e Potássio (K) na sua composição, sendo estes três macronutrientes essenciais para o desenvolvimento saudável das plantas. Esses nutrientes desempenham funções vitais: o N, para o crescimento de folhas e caules; o P, para o desenvolvimento de raízes e florescer; e o K, para fortalecer os tecidos vegetais e aumentar a resistência a doenças. Os fertilizantes NPK são formulados em diversas proporções, conforme a necessidade de nutrientes requerida.
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